"Gosto do modo carinhoso do inacabado, do mal feito, daquilo que desajeitadamente tenta um pequeno voo e cai sem graça no chão".
Talvez a frase de Clarice Linspector sintetize a experiência humana em relação ao amor, ou seja, a busca pela completude nas relações amorosas, que acaba esbarrando no inacabado, no incompleto voo de um sentimento incompreendido na sua profundidade. Por isso, mal usado e praticado.
Neste sentido, a vida, que deveria ser uma oportunidade do homem assimilar os significados do amor, torna-se para muitos indivíduos um ciclo vicioso de busca e frustração amorosa, isto é, uma experiência incompleta que termina intensificando sentimentos negativos geradores de desequilíbrios do corpo e da alma.
Processo inconsciente que alimenta fantasias e cria expectativas em torno de um amor idealizado, mas sem raízes terrenas, onde a dor que é inerente ao ser de natureza imperfeita, é canalizada pela via da relação que já nasce eterna e repleta de gozo e harmonia.
Na ânsia de aliviar a sua dor psíquica, o ser pensante lança-se em busca do par perfeito, do amor incondicional e eterno, mas cai na armadilha do amor impossível, difícil ou não correspondido chamado de "amor platônico". Fixação que revela, nos seus bastidores, o medo de se machucar ou medo de verificar que as suas fantasias e expectativas não correspondem à realidade mundana.
A necessidade da pessoa ser aceita e amada, a qualquer custo, desencadeia o que chamamos de ilusão: um produto da imaginação que tem a capacidade de ofuscar a razão para que não se possa discernir a realidade dos fatos. Viver uma ilusão, portanto, significa viver um engano, viver uma percepção falsa da realidade de si mesmo, e transferir para o outrem a realização de um desejo inconsciente, mas que revela à luz da consciência, ser uma proteção compensatória e uma manobra defensiva contra a inevitabilidade da dependência e do desamparo, geradores da dor original.
Em busca da realização de um desejo alimentado pela ilusão da alma gêmea, da cara-metade ou do amor eterno, inúmeros casais unem-se arrebatados de amor, que logo acaba diante dos atritos e dificuldades da relação. Julgando que erraram na escolha, continuam alimentando secreto desejo de um novo encontro, na eterna procura da alma afim. Mas encontram novas algemas, eternizando suas angústias e gerando problemas que se sucedem, indefinidamente.
Em vários casos acompanhados pela Psicoterapia Interdimensional, sentimentos de rejeição e abandono são potencializados porque se repetem através de experiências vivenciadas no ciclo reencarnatório do espírito imortal. Informações que emergem à luz da consciência pela regressão de memória, como é o caso de uma jovem mulher que abordaremos a seguir.
Na regressão, a mulher acessou situações que reforçaram o seu sentimento de desamparo, gerado pelo trauma da morte da avó, quando ela tinha três anos e recordada em detalhes. Numa segunda vivência, viu-se envolvida numa cena na qual jazia uma criança doente e um homem gravemente ferido. Sentia-se impotente e desamparada, em decorrência das condições de saúde do filho e de seu companheiro. E numa terceira vivência, encontrava-se perdida numa floresta e angustiada pela sensação de estar sozinha e desprotegida num lugar inóspito.
Na verdade, a jovem já traz em seu padrão emocional-comportamental, os sentimentos de perda e desamparo, reforçados pela experiência de relação com as figuras parentais da vida atual, ou seja, pais distantes e pouco afetivos.
A experiência regressiva mostrou que é contra este paradigma que a jovem tem que lutar, no sentido de alterá-lo, pois a vida está posta para que ela desafie os seus medos, inseguranças, bloqueios e condicionamentos. E que possa investir no presente com amor-próprio, aceitação, autoconfiança, autorresponsabilidade e cortar a sintonia com o passado, exorcizando os seus "fantasmas" e providenciando a sua libertação.
O ser humano está querendo sempre ser amado e aceito pelo outro, sem se questionar se internamente está pronto para o relacionamento. O amor é um sentimento precioso que vem inevitavelmente acompanhado de desapego e aceitação. Numa relação a dois, esse sentimento resulta em atenção, carinho, amizade, presença de ambos e crescimento mútuo.
Presença é desenvolver o hábito do autoconhecimento, aceitar-nos com todas as qualidades e defeitos. Depender de alguém para ser feliz é a maior cilada já inventada pelo ego. O outro não tem a obrigação e nem vai completá-lo nunca. Você é quem deve se preencher completamente para, então, satisfazer o outrem. Esta é a mágica do amor: para amar alguém de verdade, temos que nos amar muito antes, o que significa aceitação e respeito. Desta forma, você estará pronto para amar e ser amado, como referiu-se Paulo Coelho: "É mais fácil amar que ser amado. Aceite o amor, ele não vai ficar esperando para sempre".
Nesta lógica, encontramos uma publicação num periódico digital da Colômbia. É um relato de uma médica que nos faz refletir sobre a dimensão do amor em nossas vidas: "Um homem de certa idade foi à clínica onde trabalho para tratar uma ferida na mão. Estava apressado e enquanto o tratei perguntei-lhe o que tinha de tão urgente para fazer. Ele me disse que precisava ir a um asilo de idosos para tomar café da manhã com sua esposa que estava internada lá. Disse-me que ela estava internada naquele lugar há algum tempo porque sofria o Mal de Alzheimer, já bastante avançado. Enquanto acabava de fazer o curativo, perguntei-lhe se sua esposa se incomodaria se caso ele chegasse atrasado naquela manhã. Não, respondeu ele, ela já não sabe quem eu sou. Faz quase cinco anos que não me reconhece.
Então lhe perguntei com certo espanto: mas se ela já não sabe quem é o senhor, porque essa necessidade de estar com ela todas as manhãs? Ele sorriu e com um olhar enternecido disse-me: É... Ela já não sabe quem eu sou, mas eu, entretanto, sei muito bem quem é ela. Tive de conter as lágrimas enquanto ele saía, e pensei: é este tipo de amor que eu quero para a minha vida. O verdadeiro amor não se reduz ao físico nem ao romântico. O verdadeiro amor é a aceitação de tudo o que o outro é, do que foi, do que será e do que já não é".
por Flávio Bastos
Flavio Bastos é criador intuitivo da Psicoterapia Interdimensional (PI) e psicanalista clínico. Outros cursos: Terapia Regressiva Evolutiva, Psicoterapia Reencarnacionista, Terapia Floral, Psicoterapia Holística, Parapsicologia, Capacitação em Dependência Química, Hipnose e Auto-hipnose e Dimensão Espiritual na Psicologia e Psicoterapia.
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